domingo, 20 de maio de 2012

PostHeaderIcon Pina (parte II)


 


Philippine Bausch (1940-2009) ou simplesmente Pina foi uma renomada dançarina, coreógrafa e diretora de balé, de nacionalidade alemã. Wim Wenders (1945-) é um cineasta do chamado Novo Cinema Alemão (movimento cinematográfico iniciado entre as décadas de 1960 e 1970), que teve como expoentes, além de Wenders, Rainer Fassbinder e Werner Herzog (embora este último não se considere membro do grupo, mas “apenas” um simpatizante), entre outros. Atualmente (abril de 2012) se encontra em cartaz no Brasil o filme “Pina” (Wim Wenders, 2011, Alemanha/França/Reino Unido), que une justamente estas duas figuras: Pina e Wenders, que, segundo li em algum lugar, era fã da coreógrafa. Quanto a esta, nunca ouvira falar dela. Já o nome do cineasta não me era estranho; entretanto, embora tenha mergulhado na cinematografia de Herzog desde o início de minha incursão no cinema autoral europeu (em 2006), e embora tenha gostado bastante de algumas de suas obras, só assisti a filmes de Wenders este ano (!) e ainda sou virgem no que concerne às obras de Fassbinder (dos demais integrantes do movimento sequer sei os nomes de cor). Meu primeiro filme de Wenders foi o documentário “Buena Vista Social Club” (1999) e, sem seguida, “Asas do desejo” (1987), ambos constituindo realizações de destaque do cineasta. Não sei se chega a ser paradoxal, mas é no mínimo curioso que “Pina” tenha me remetido muito mais a “Asas do desejo” (que não é documentário) do que a “Buena Vista Social Club”, que o é.

 
Boa parte das resenhas sobre “Pina” que li na internet destacam um aspecto básico da obra: trata-se dum documentário não convencional; nada é dito sobre sua vida pessoal da artista, exceto menções à sua solidão. Para quem não sabe, o filme foi iniciado com Pina ainda viva e teria uma outra dinâmica; com a sua morte, Wenders pensou em desistir da obra, mas acabou realizando-a de modo diferente do original; a protagonista (se é que podemos chamá-la assim) pouco aparece, e se não me falha a memória, possui uma única fala em todo o filme. Grosso modo, a obra alterna performances de danças dirigidas/coreografadas por Pina como depoimentos de vários dançarinos que trabalharam com ela. Também nisso (nos depoimentos) o filme é não convencional: não vemos os depoentes falando, mas calados, enquanto ouvimos suas respectivas vozes, talvez intentando simular serem tais palavras pensamentos.

 
Estranhamente, tal estrutura não convencional de “Pina” só começou a ficar minimamente cansativa para mim próximo do final do filme, ao contrário do que aconteceu com o outro documentário aqui mencionado de Wenders (ao contrário de Pina, que me era desconhecida, o Buena Vista Social Club – tema do outro documentário – era por mim conhecido e apreciado); inicialmente pensei desconhecer o motivo, mas pensando um pouco, acredito tê-lo descoberto: por mais que no documentário sobre a banda cubana haja passagens dos músicos tocando, elas são bem mais breves que as coreografias apresentadas em “Pina”, de modo que o efeito estético deste filme é muito maior que o daquele. Faz-se então pertinente a seguinte ressalva: embora tenha assistido “Pina” no cinema, este não possuía a tecnologia 3d, o que talvez acarrete uma lacuna insuperável em minha apreciação da obra. Ao que me consta, tal filme do Wenders foi o primeiro filme de arte a utilizar o recurso 3d e isto, por si só, já o tornaria deveras interessante (pelo que li, alguns dos efeitos 3d enriquecem a obra de maneira impressionante, ao passo noutros momentos a tecnologia mostra-se ainda ineficiente).

 
“Pina” nada tem de entretenimento; não me divertiu, mas deixou-me pensativo, o que soa paradoxal, haja vista ser o filme calcado na sensação e não no entendimento. Experenciei momentos de um quase arrebatamento, sobretudo no início, quando a coreografia se construía ao som da magnífica Sagração da primavera de Stravinsky. Não defendo aqui que a obra não possa ser entendida, mas que seu foco está na sensação. Como a própria Pina afirma no filme: “Tem coisas que nos deixam sem palavras. E tem coisas que as palavras não dão conta de dizer. É aí que entra a dança”. Altamente recomendado.



Alberto Bezerra de Abreu, abril/maio de 2012

3 comentários:

Miradouro Cinematográfico disse...

Eis o que há de positivo e de negativo na utilização da tecnologia 2d no filme, segundo um dos textos que li:

"3D or not 3D, that is the question... mas uma questão que também não precisa ser respondida já. A justaposição com a metragem de arquivo de Café Müller, por exemplo, deixa óbvio onde o espectador de 2011 sai ganhando: a sensação de profundidade e a definição são infinitamente superiores, captam-se detalhes de textura da pele, cabelos, o suor dos corpos; por vezes tem-se a sensação de estar em meio aos dançarinos, dá quase para sentir o cheiro deles.
Entretanto, nos deslocamentos rápidos diante de fundo escuro, a cinematografia 3D também mostra suas (atuais) limitações, pois esses movimentos parecem pouco naturais, entrecortados. A impressão de perspectiva nem sempre é verossímil, por momentos as pessoas parecem figuras de papelão recortadas diante de um fundo. Talvez a técnica ainda precise amadurecer."

Retirado do texto: "Documentário de Wim Wenders celebra a arte de Pina Bausch" cujo autor é Augusto Valente; eis o link:

http://www.dw.de/dw/article/0,,14840895,00.html

Marcel Koury disse...

Embora a dança seja a expressão artística do qual menos tenho a necessária sensibilidade de imersão, sou apenas elogios em relação ao filme.

Um alegoria da perpetuação na arte que exterioriza-se e repete-se no cotidiano — uma deslumbrante homenagem (muitas vezes, um mundo deveras fechado entre quem homenageia e a homenageada, é bem verdade).


Ainda tenho esperança de que a obra entre em cartaz no "circuitão" para assisti-lo como foi concebido: em 3D (*conditio sine qua non*, assim como no lindo "A Invenção de Hugo Cabret").

Miradouro Cinematográfico disse...

Embora concorde com a "conditio sine qua non", pessoalmente não sinto NECESSIDADE de assisti-lo como foi concebido; sinto, acima de tudo, CURIOSIDADE.

"A invenção de Hugo Cabret" vi no São Luiz mesmo e a questão do 3D passou-me despercebida. Fiz uma apropriação muito pessoal dele e pretendo resenha-lo, embora provavelmente só quando revê-lo (em DVD).

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Alguém que escreve para viver, mas não vive para escrever; apaixonado pelas artes; misantropo humanista; intenso, efêmero e inconstante; sou aquele que pensa e que sente, que questiona e duvida, que escapa a si mesmo e aos outros. Sou o devir =)
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