quarta-feira, 5 de maio de 2010
Cine PE 2010 quinta-feira: brega, azul e garotada
22:56 |
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Miradouro Cinematográfico |
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Do morro
Após perder a exibição de filmes na segunda e na quarta (e ir na terça), retorno ao Cine PE na quinta-feira, noite recheada de curtas pernambucanos e contando com apenas um longa. Desta vez cheguei mais tarde (havia tido aula – justamente de lógica, ah infortúnio!) a tarde, e logo pude perceber que o público seria maior (de fato o Teatro Guararapes lotou e não foram poucas as pessoas quem sentaram nos degraus, como sempre acontece nos dias mais concorridos). Na fileira a minha frente sentaram, a minha esquerda Jomard Muniz de Britto e a minha direita Alexandre Figueirôa, dois importantes nomes da cultura pernambucana e após algum tempo me dei conta que apesar de não os ter cumprimentado (estavam entre amigos), eu não só sabia quem eles eram, mas já tivera a oportunidade de trocar breves palavras com ambos anos atrás.
Não foram poucas as menções feitas na hora das apresentações dos responsáveis por cada um dos filmes exibidos (alguns representados por apenas uma pessoa, outros por equipes, algumas menores, outras maiores) de que tal festival é o maior do país em termos de público, o que é um orgulho para os organizadores e para o público (na verdade, durante todo o festival, boa parte – a maioria, acredito eu – dos realizadores repetiu esta fala).
A noite foi aberta com o curta “Do morro?”(Mykaela Plotkin; Rafael Montenegro, PE), que trás como personagem o músico (!?!) João do morro. Além de cenas deste em ação (cantando) e falando (em entrevistas específicas para o documentário), a obra conta com a participação de figuras destacadas da cena musical recifense (sejam músicos, produtores, etc.). Lula Queiroga e outros defendem a perspectiva de João do moro como cronista da periferia, alguém que escreve sobre o cotidiano da comunidade, sobre o que realmente acontece; China refuta tal visão, definindo-o como um cara que escreve coisas divertidas, e afirmando que essa história de cronista é tentativa de rotulação e enquadramento por parte da classe média; Roger de Renor afirma ser bom que quando João do moro vai tocar na zona sul e cobra caro; houve ainda um cara (do site Recife rock se não me engano) que disse que a classe média atualmente só escuta porcaria (citou Ivete Sangalo, Kalypso, entre outros que não recordo). Tratou-se também da polêmica acerca da música “papa frango” (!), tendo o representante de algum grupo gay dado entrevista considerando a música ofensiva e pedindo sua não vinculação em rádios, não comercialização e não execução em shows. Em que pese a vulgaridade da letra, a idéia de censura me cheira muito mal. Penso que melhor seria investir em conscientização (não sei se vocês pararam para pensar que atualmente o preconceito racial é mais condenado que o sexual, pois é comum vermos musicas pejorativas em relação a homossexuais ou mulheres, mas não em relação a “pretos” ou “amarelos”, por exemplo). Foi interessante notar que apesar do discurso pró-brega do realizador de uns dos filmes (foram dois com esta temática na noite de quinta) e da calorosa aclamação do público a ambos os curtas, não só em seu término, mas mesmo antes de começarem, muitas pessoas aplaudiram as críticas presentes a João do moro apresentadas neste primeiro filme, considerando suas letras grosseiras, ofensivas e mesmo baixas. Pessoalmente achei o filme interessantíssimo (até porque não deixa de apresentar visões contrárias ao “músico”), mas considero sua “música” um lixo. Deveras repetitiva e simples instrumentalmente, vulgar, apelativa e fútil em suas letras. Eis então um questionamento final: de fato, não deixa de ser interessante um músico falar do cotidiano onde vive e, acima de tudo, usando a língua do povo (e ai esta o motivo do sucesso de tal “artista”, penso eu: o uso da linguagem chula tão apreciada pela ralé); porém, não é papel da arte criar o novo ao invés de apenas reproduzir o existente? E se for para descrever o que é, e não o que deveria ser, acredito que a crítica social é muito mais saudável. Assumo aqui uma postura elitista conscientemente, pois para mim o popular não precisa ser vulgar, rasteiro e apelativo (vide Cartola).
O segundo curta foi “Ensaio de cinema” (Allan Ribeiro, RJ), que mostra o cotidiano de dois gays num pequeno apartamento; um costura, o outro cozinha. A certa altura, simulam a gravação de um filme, com menções a “Dança dos vampiros” (Polanski), “Profissão repórter” Antonioni e talvez mais algum que não lembro. A forma como um deles junta as mãos, simulando a lente da câmera e descreve os processos desta (recuo, travelling com lenta aproximação, etc.) mostra uma interessante entrega àquele exercício abstrato. Depois deste ensaio, ambos conversam sobre célebres filmes brasileiros. Dentre os citados, lembro dos seguintes: “Vidas secas”, “Macunaíma”, “A dama do lotação” e algum adaptado da obra de Jorge Amado (não lembro se Dona Flor ou Gabriela). Pessoalmente, me interessei mais por tais menções cinematográficas (que, aliás, podem servir de indicação para futuras resenhas deste blog!) do que propriamente pelo filme.
O filme seguinte foi “A montanha mágica” (Petrus Cariry, CE), belíssimo em ângulos de câmera (que sobe, dá close, visão panorâmica, entre outros recursos); belíssima fotografia, como quando se mostra o parque e em especial a roda gigante durante a aurora; há muitos trechos sem fala, o que torna o filme lento, difícil, cansativo até; as partes faladas esclarecem o sentido da obra: nostalgia, como quando o narrador fala que nada na rua onde morou havia mudado e que ainda consegue sentir (lembrar) do cheiro da gráfica que funcionava ao lado da casa onde morava. A montanha mágica do título é a forma como o personagem principal (que não aparece e narra em off) chamava a roda gigante. Os diversos ângulos de câmera, mostrando diversas partes do parque, sempre vazio (indicando o declínio de sua existência) me remeteu a pelo menos duas idas minha a parque de diversões (parque de rua, fique claro); a primeira eu mal recordo; a segunda se deu num parque montado onde hoje é o estacionamento do Chevrolett Hall (parte da frente, que dá para a Avenida Agamenon Magalhães), muitos anos antes de tal casa de shows ser construída. Não deixou de causar nostalgia em mim também, que assim me identifiquei um pouco com o narrador.
A noite prosseguiu com “Circuito interno” (Júlio Martí, SP), que denuncia a exploração de trabalhadores bolivianos em confecções clandestinas no Brasil. Uma cena recorrente mostra uma TV com tela dividida filmando 4 cômodos simultaneamente (inclusive o banheiro!), demonstrando viverem os trabalhadores em regime de prisão domiciliar (tanto é assim que um dos trabalhadores pede autorização ao patrão para sair e levar um garoto para sem batizado). Há ainda duas cenas (complementares) que merecem destaque: a que um contratante pede uma certa quantidade que camisas (20 mil, se não me engano) para sexta-feira; o dono da fábrica após dizer que não poderia faze-lo em tão pouco tempo, afirma que lhe abrirá uma exceção, mas que o preço será 5$ por peça, ao que o contratante retruca ser muito caro, pois paga caro pelo selo de originalidade (!), e que se fosse por esse preço, procuraria brasileiros, de modo que ameaça denunciar a confecção clandestina. Na cena seguinte vemos os trabalhadores costurando camisas verdes (trata-se justamente da camisa da seleção brasileira, mas não a amarela). Na saída para o batismo, o homem e o menino vêem a camisa a venda na vitrine de uma loja por um preço várias vezes mais caro que o de produção (49$ se não me engano). Nos créditos, o filme esclarece que a exploração aos bolivianos em confecções de roupas brasileiras chega a 15h de trabalho diária destes. Destaco que o filme não poderia ser exibido em momento mais oportuno (as vésperas de uma copa do mundo – chega a ser cômico que no festival tenha sido realizado diariamente um sorteio de camisas da seleção brasileira distribuídas pela TAM, uma das patrocinadoras do evento).
O próximo curta foi “Faço de mim o que quero” (Sérgio Oliveira; Petrônio Lorena, PE), outro sobre o brega, mas não especificamente sobre João do morro, mostrando Kelvis Duran, Conde entre outros, além de muitas pessoas comuns. Ao contrário do primeiro curta, este não se vale de entrevistas, apostando numa descrição de shows, vinculação de músicas na rádio, etc. Considero “Do morro?” superior (mais bem feito, mais crítico e diversificado), mas foi “Faço de mim o que quero” não deixa de ser interessante e foi tão aplaudido quanto seu companheiro de temática. Acredito que nenhum dos dois fez apologia do brega, no sentido de afirmar que seja bom, mas ambos valorizaram tal “música” como uma legítima manifestação cultural da periferia (que inclusive invade a classe média, como o primeiro filme deixou claro). Cabe salientar (a respeito da já mencionada polemica sobre a música “papa frango”, que num dos shows mostrado no primeiro curta aparecem alguns homossexuais dançando alegremente ao som da música que lhes seria pejorativa).
Finalizando os curtas, tivemos “Azul” (Eric Laurence, PE), baseado no conto “Uma doce maneira de ir morrendo” de Luzilá Gonçalves. Contando com temática da espera e da solidão e belíssima fotografia, o filme abusa do uso da cor que lhe dá nome: roupa, toalha da mesa, sapatos, parede da casa, fita no cabelo, papel da carta, tudo é azul; a forma como se utiliza a iluminação faz com que tudo na casa pareça ser azul; o horizonte retratado lindamente nas cenas exteriores da casa é de um azul que parece irá nos engolir; até mesmo a parte inferior/ central da chama das velas é azul (lembrando a chama de um fogão). O cágado que passeia pela casa em diversos momentos constitui um sutil elemento cômico. O trecho final da sinopse, ao afirmar a “necessidade de criar fantasias para suportar a solidão” dá margem para o questionamento de se a visita do filho realmente aconteceu (ao menos eu penso assim) e o fato de o filme não seguir uma linearidade cronológica torna seu enredo mais interessante e ocasiona a necessidade de que o assistamos novamente para compreendê-lo melhor. Belíssimo na forma, desafiador no conteúdo.
O único longa da noite certamente foi um dos filmes mais esperados de todo o festival; “As melhores coisas do mundo” (Laís Bodanzky, SP). A cineasta, ao apresentar sua obra, esclareceu ser ela seu quarto longa-metragem, tendo todos eles passado pelo Cine PE (entre eles o premiado “Bicho de sete cabeças” em 2001 ). “As melhores coisas do mundo” é um filme convencional, comercial e nem por isso ruim; é muito bem feito e apesar dos clichês, funciona. Conta a história de um adolescente, mostrando as dificuldades e os prazeres pelos quais ele passa, como a separação dos pais, a insegurança acerca de seus sentimentos, a primeira relação sexual... Merece destaque a temática do preconceito, mostrando que a distância entre vítima e algoz por vezes é ínfima ou mesmo inexistente. O filme estreará em breve no circuito comercial e merecerá uma resenha a parte.
Meus favoritos da noite foram o grande vencedor da X1V edição do Cine PE “As melhores coisas do mundo” e o lindo e subestimado “Azul” (se não me engano não ganhou nenhum prêmio).
Alberto Bezerra de Abreu, abril/maio de 2010
Não foram poucas as menções feitas na hora das apresentações dos responsáveis por cada um dos filmes exibidos (alguns representados por apenas uma pessoa, outros por equipes, algumas menores, outras maiores) de que tal festival é o maior do país em termos de público, o que é um orgulho para os organizadores e para o público (na verdade, durante todo o festival, boa parte – a maioria, acredito eu – dos realizadores repetiu esta fala).
A noite foi aberta com o curta “Do morro?”(Mykaela Plotkin; Rafael Montenegro, PE), que trás como personagem o músico (!?!) João do morro. Além de cenas deste em ação (cantando) e falando (em entrevistas específicas para o documentário), a obra conta com a participação de figuras destacadas da cena musical recifense (sejam músicos, produtores, etc.). Lula Queiroga e outros defendem a perspectiva de João do moro como cronista da periferia, alguém que escreve sobre o cotidiano da comunidade, sobre o que realmente acontece; China refuta tal visão, definindo-o como um cara que escreve coisas divertidas, e afirmando que essa história de cronista é tentativa de rotulação e enquadramento por parte da classe média; Roger de Renor afirma ser bom que quando João do moro vai tocar na zona sul e cobra caro; houve ainda um cara (do site Recife rock se não me engano) que disse que a classe média atualmente só escuta porcaria (citou Ivete Sangalo, Kalypso, entre outros que não recordo). Tratou-se também da polêmica acerca da música “papa frango” (!), tendo o representante de algum grupo gay dado entrevista considerando a música ofensiva e pedindo sua não vinculação em rádios, não comercialização e não execução em shows. Em que pese a vulgaridade da letra, a idéia de censura me cheira muito mal. Penso que melhor seria investir em conscientização (não sei se vocês pararam para pensar que atualmente o preconceito racial é mais condenado que o sexual, pois é comum vermos musicas pejorativas em relação a homossexuais ou mulheres, mas não em relação a “pretos” ou “amarelos”, por exemplo). Foi interessante notar que apesar do discurso pró-brega do realizador de uns dos filmes (foram dois com esta temática na noite de quinta) e da calorosa aclamação do público a ambos os curtas, não só em seu término, mas mesmo antes de começarem, muitas pessoas aplaudiram as críticas presentes a João do moro apresentadas neste primeiro filme, considerando suas letras grosseiras, ofensivas e mesmo baixas. Pessoalmente achei o filme interessantíssimo (até porque não deixa de apresentar visões contrárias ao “músico”), mas considero sua “música” um lixo. Deveras repetitiva e simples instrumentalmente, vulgar, apelativa e fútil em suas letras. Eis então um questionamento final: de fato, não deixa de ser interessante um músico falar do cotidiano onde vive e, acima de tudo, usando a língua do povo (e ai esta o motivo do sucesso de tal “artista”, penso eu: o uso da linguagem chula tão apreciada pela ralé); porém, não é papel da arte criar o novo ao invés de apenas reproduzir o existente? E se for para descrever o que é, e não o que deveria ser, acredito que a crítica social é muito mais saudável. Assumo aqui uma postura elitista conscientemente, pois para mim o popular não precisa ser vulgar, rasteiro e apelativo (vide Cartola).
O segundo curta foi “Ensaio de cinema” (Allan Ribeiro, RJ), que mostra o cotidiano de dois gays num pequeno apartamento; um costura, o outro cozinha. A certa altura, simulam a gravação de um filme, com menções a “Dança dos vampiros” (Polanski), “Profissão repórter” Antonioni e talvez mais algum que não lembro. A forma como um deles junta as mãos, simulando a lente da câmera e descreve os processos desta (recuo, travelling com lenta aproximação, etc.) mostra uma interessante entrega àquele exercício abstrato. Depois deste ensaio, ambos conversam sobre célebres filmes brasileiros. Dentre os citados, lembro dos seguintes: “Vidas secas”, “Macunaíma”, “A dama do lotação” e algum adaptado da obra de Jorge Amado (não lembro se Dona Flor ou Gabriela). Pessoalmente, me interessei mais por tais menções cinematográficas (que, aliás, podem servir de indicação para futuras resenhas deste blog!) do que propriamente pelo filme.
O filme seguinte foi “A montanha mágica” (Petrus Cariry, CE), belíssimo em ângulos de câmera (que sobe, dá close, visão panorâmica, entre outros recursos); belíssima fotografia, como quando se mostra o parque e em especial a roda gigante durante a aurora; há muitos trechos sem fala, o que torna o filme lento, difícil, cansativo até; as partes faladas esclarecem o sentido da obra: nostalgia, como quando o narrador fala que nada na rua onde morou havia mudado e que ainda consegue sentir (lembrar) do cheiro da gráfica que funcionava ao lado da casa onde morava. A montanha mágica do título é a forma como o personagem principal (que não aparece e narra em off) chamava a roda gigante. Os diversos ângulos de câmera, mostrando diversas partes do parque, sempre vazio (indicando o declínio de sua existência) me remeteu a pelo menos duas idas minha a parque de diversões (parque de rua, fique claro); a primeira eu mal recordo; a segunda se deu num parque montado onde hoje é o estacionamento do Chevrolett Hall (parte da frente, que dá para a Avenida Agamenon Magalhães), muitos anos antes de tal casa de shows ser construída. Não deixou de causar nostalgia em mim também, que assim me identifiquei um pouco com o narrador.
A noite prosseguiu com “Circuito interno” (Júlio Martí, SP), que denuncia a exploração de trabalhadores bolivianos em confecções clandestinas no Brasil. Uma cena recorrente mostra uma TV com tela dividida filmando 4 cômodos simultaneamente (inclusive o banheiro!), demonstrando viverem os trabalhadores em regime de prisão domiciliar (tanto é assim que um dos trabalhadores pede autorização ao patrão para sair e levar um garoto para sem batizado). Há ainda duas cenas (complementares) que merecem destaque: a que um contratante pede uma certa quantidade que camisas (20 mil, se não me engano) para sexta-feira; o dono da fábrica após dizer que não poderia faze-lo em tão pouco tempo, afirma que lhe abrirá uma exceção, mas que o preço será 5$ por peça, ao que o contratante retruca ser muito caro, pois paga caro pelo selo de originalidade (!), e que se fosse por esse preço, procuraria brasileiros, de modo que ameaça denunciar a confecção clandestina. Na cena seguinte vemos os trabalhadores costurando camisas verdes (trata-se justamente da camisa da seleção brasileira, mas não a amarela). Na saída para o batismo, o homem e o menino vêem a camisa a venda na vitrine de uma loja por um preço várias vezes mais caro que o de produção (49$ se não me engano). Nos créditos, o filme esclarece que a exploração aos bolivianos em confecções de roupas brasileiras chega a 15h de trabalho diária destes. Destaco que o filme não poderia ser exibido em momento mais oportuno (as vésperas de uma copa do mundo – chega a ser cômico que no festival tenha sido realizado diariamente um sorteio de camisas da seleção brasileira distribuídas pela TAM, uma das patrocinadoras do evento).
O próximo curta foi “Faço de mim o que quero” (Sérgio Oliveira; Petrônio Lorena, PE), outro sobre o brega, mas não especificamente sobre João do morro, mostrando Kelvis Duran, Conde entre outros, além de muitas pessoas comuns. Ao contrário do primeiro curta, este não se vale de entrevistas, apostando numa descrição de shows, vinculação de músicas na rádio, etc. Considero “Do morro?” superior (mais bem feito, mais crítico e diversificado), mas foi “Faço de mim o que quero” não deixa de ser interessante e foi tão aplaudido quanto seu companheiro de temática. Acredito que nenhum dos dois fez apologia do brega, no sentido de afirmar que seja bom, mas ambos valorizaram tal “música” como uma legítima manifestação cultural da periferia (que inclusive invade a classe média, como o primeiro filme deixou claro). Cabe salientar (a respeito da já mencionada polemica sobre a música “papa frango”, que num dos shows mostrado no primeiro curta aparecem alguns homossexuais dançando alegremente ao som da música que lhes seria pejorativa).
Finalizando os curtas, tivemos “Azul” (Eric Laurence, PE), baseado no conto “Uma doce maneira de ir morrendo” de Luzilá Gonçalves. Contando com temática da espera e da solidão e belíssima fotografia, o filme abusa do uso da cor que lhe dá nome: roupa, toalha da mesa, sapatos, parede da casa, fita no cabelo, papel da carta, tudo é azul; a forma como se utiliza a iluminação faz com que tudo na casa pareça ser azul; o horizonte retratado lindamente nas cenas exteriores da casa é de um azul que parece irá nos engolir; até mesmo a parte inferior/ central da chama das velas é azul (lembrando a chama de um fogão). O cágado que passeia pela casa em diversos momentos constitui um sutil elemento cômico. O trecho final da sinopse, ao afirmar a “necessidade de criar fantasias para suportar a solidão” dá margem para o questionamento de se a visita do filho realmente aconteceu (ao menos eu penso assim) e o fato de o filme não seguir uma linearidade cronológica torna seu enredo mais interessante e ocasiona a necessidade de que o assistamos novamente para compreendê-lo melhor. Belíssimo na forma, desafiador no conteúdo.
O único longa da noite certamente foi um dos filmes mais esperados de todo o festival; “As melhores coisas do mundo” (Laís Bodanzky, SP). A cineasta, ao apresentar sua obra, esclareceu ser ela seu quarto longa-metragem, tendo todos eles passado pelo Cine PE (entre eles o premiado “Bicho de sete cabeças” em 2001 ). “As melhores coisas do mundo” é um filme convencional, comercial e nem por isso ruim; é muito bem feito e apesar dos clichês, funciona. Conta a história de um adolescente, mostrando as dificuldades e os prazeres pelos quais ele passa, como a separação dos pais, a insegurança acerca de seus sentimentos, a primeira relação sexual... Merece destaque a temática do preconceito, mostrando que a distância entre vítima e algoz por vezes é ínfima ou mesmo inexistente. O filme estreará em breve no circuito comercial e merecerá uma resenha a parte.
Meus favoritos da noite foram o grande vencedor da X1V edição do Cine PE “As melhores coisas do mundo” e o lindo e subestimado “Azul” (se não me engano não ganhou nenhum prêmio).
Alberto Bezerra de Abreu, abril/maio de 2010
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About Me
- Miradouro Cinematográfico
- Alguém que escreve para viver, mas não vive para escrever; apaixonado pelas artes; misantropo humanista; intenso, efêmero e inconstante; sou aquele que pensa e que sente, que questiona e duvida, que escapa a si mesmo e aos outros. Sou o devir =)
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