segunda-feira, 28 de março de 2011

PostHeaderIcon Glauber Rocha: o mais importante cineasta brasileiro?


Todo juízo de valor implica o seguinte questionamento: é ele fundado em algo objetivo ou subjetivo? Inicio o presente texto com tal reflexão para defender a seguinte perspectiva: considerar Glauber Rocha como sendo o melhor cineasta brasileiro é algo inserido no âmbito da subjetividade; eu, por exemplo, sou completamente apaixonado por “Lavoura arcaica”, filme de 2001, dirigido por Luiz Fernando Carvalho, paixão tal que me faz considerar tal cineasta como o melhor do país, embora o filme citado seja o único por ele realizado até então (além dele, Carvalho dirigiu séries exibidas na Rede Globo, a mais recente delas intitulada “Afinal, o que querem as mulheres?”, merecendo destaque ainda as excelentes “Capitu” e “A pedra do reino”). Porém, admito que tal opinião é subjetiva, pois se insere fortemente em me gosto pessoal; por outro lado, a perspectiva segundo a qual Glauber Rocha foi (e continua sendo) o mais importante cineasta do país, parece-me fundada em dados objetivos, e não em preferências pessoais de gosto. Deixando de lado a posição hipócrita do “ter de gostar de algo por ser ele reconhecidamente bom segundo as autoridades intelectuais”, afirmo que a questão “gostar ou não gostar” do cinema glauberiano é bastante controversa, complexa e ambígua.

Para abordar tal questão espinhenta (colocar o gosto pessoal acima da “autoridade intelectual dos críticos”, os quais dizem o que é bom e o que é ruim), recorrerei à minha experiência pessoal: em meados de 2008, assisti meu primeiro filme de Glauber Rocha na Fundaj, num festival que comemorava os 40 anos do turbulento ano de 1968; tratava-se de “Terra em transe” e achei-o nada menos que excelente, fazendo jus a minha nada singela expectativa; não lembro bem quanto tempo depois, assisti em DVD a “Deus e o diabo na terra do sol” e, não sem certo pesar, sentencio: detestei. Ambos são filmes herméticos e difíceis, ao menos se comparados ao “cinemão” de entretenimento o qual, década após década, somos acostumados a consumir. Porém, enquanto o primeiro me envolveu e me causou empatia, o segundo só me causou enfado e nada me disse. Evidentemente, quando conhecemos algo devidamente contextualizado, temas mais elementos para apreendermos a obra, e como assisti a ambos os filmes já a alguns anos, em época que quase nada sabia de seu realizador, é bem possível que ao (re)assisti-los, minha reação seja outra.

Pois bem, dito isto, chego enfim ao tema que me levou a redigir este texto: neste ano de 2011, completam-se 30 anos da morte de Glauber Rocha e, em justa homenagem, a revista CULT lhe dedicou uma matéria de capa; esta conta com textos de especialistas na obra do cineasta e constituem valiosos dados de introdução no universo glauberiano. Glauber não se limitou a dirigir filmes, mas escrevia para diversos jornais, exercendo a função de agitador cultural e combinando estética com política (seu cinema é o que se pode chamar de engajado, sem, contudo, ser submisso a qualquer determinação externa ao autor: nada de submeter-se aos ditames do Partido – Glauber se dizia comunista, mas nunca filiou-se a tal partido, mantendo assim sua autonomia – ou do que quer que fosse, pois, tanto forma quanto conteúdo advinham do próprio Glauber, e não de modelos pré-estabelecidos).

Percebo que ainda não proferi meu argumento em defesa da perspectiva segundo a qual Glauber é o mais importante cineasta brasileiro; farei-o então agora. Como quis argumentar antes de passar a isso, a questão da qualidade ou não de seu cinema não deixa de passar pela questão subjetiva do gosto, afinal, para algumas pessoas, por mais profundo que seja um filme, se ele não causar algum tipo de prazer, ele é ruim. Neste sentido, poder-se-ia dizer que, “Deus e o diabo...” é um filme ruim. Não concordo com tal perspectiva, mas não tratarei dela neste texto. O foco de minha argumentação é outro; trata-se do seguinte: gostando ou não das obras de Glauber, não se pode negar sua originalidade, bem como a grande repercussão por elas alcançadas, inclusive no exterior (o cineasta chegou a vencer como melhor diretor no festival de Cannes – festival este muito mais sério que o tal do Oscar). Além disso, Glauber tomou a frente do célebre movimento conhecido como Cinema Novo (o qual me remete um pouco ao chamado Neo-realismo italiano, o qual, se não me engano, é pouco anterior ao movimento brasileiro, já que surgiu no imediato pós Segunda Guerra Mundial). Ou seja, Glauber Rocha pode, sem exageros, ser tido como um divisor de águas dentro da cinematografia nacional, coisa que não se pode dizer de Luiz Fernando Carvalho (que fique claro: não estou insinuando que por isto este último seja inferior àquele). Neste sentido, pode-se dizer o seguinte: pode-se gostar ou não de Glauber Rocha, mas não se pode ser indiferente a ele.

Para fechar com chave de ouro, indico o site dedicado à Glauber Rocha; lá há vasto material, inclusive textos do autor; indo na sessão “textos e poesias”, é possível ler seu texto-manifesto “Eztetyka da fome”, bem como outros textos, os quais favorecem sobremaneira uma apreensão mais profunda de seus filmes. http://www.tempoglauber.com.br/



Alberto Bezerra de Abreu, 28/03/2011

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Alguém que escreve para viver, mas não vive para escrever; apaixonado pelas artes; misantropo humanista; intenso, efêmero e inconstante; sou aquele que pensa e que sente, que questiona e duvida, que escapa a si mesmo e aos outros. Sou o devir =)
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