sábado, 2 de outubro de 2010

PostHeaderIcon A revolução não será televisionada ou quando o esquerdismo bocó fura os olhos e tritura os cérebros dos naïves



*Pedro Sobral


No ano de 2001, os cineastas irlandeses Kim Bartley e Donnacha O’Briain viajaram à Venezuela para fazer turismo político e realizar um documentário sobre o já então controverso presidente Hugo Chávez, empossado dois anos antes.

Ao longo das filmagens, a dupla irlandesa se dá conta de que está em marcha um agudo processo para depor o presidente eleito pelas urnas e, sensatamente, muda o foco do documentário da figura burlesca de Hugo Chávez para a ruidosa oposição política e midiática no país caribenho. E voilà: nasce o ornitorrinco – animal estranho, monstrengo à Frankenstein – A revolução não será televisionada (The revolution will not be televised – Irlanda, 2003, 74 minutos).

Os mais incautos dirão que A revolução não será televisionada comprova a existência de uma burguesia local malvada, alinhada ao imperialismo norte-americano, preocupada com seus próprios interesses imediatos. Mas o ambiente político da Venezuela de antes e depois das filmagens é muito mais complexo do que o vulgar maniqueísmo e não comporta enquadramentos desse modelo. Para se ter uma idéia do desgaste do sistema de representação venezuelano em 1998, basta dizer que a principal adversária de Hugo Chávez na disputa majoritária daquele ano era Irene Sáez, ex-Miss Universo, que concorreu com o arfante apoio político da Acción Democrática – agremiação que se revezava no poder com seu congênere Copei (partido democrata-cristão) havia exatamente quarenta anos.

Imediatamente após a posse, em 1999, Chávez convoca uma assembléia constituinte que dissolve a Câmara Alta do país (e sem senadores fica mais fácil governar com parca oposição tendo em vista que a Câmara Alta não é – necessariamente – governista como sói ser a Câmara Baixa), muda o nome da nação de República Federativa da Venezuela para República Bolivariana da Venezuela e revoga alguns dispositivos constitucionais acerca da extração de petróleo pela estatal Pdvsa, grande fomentador de divisas para os venezuelanos, além da lei de posse de terras.

No que toca ao adjetivo bolivariano, devo abrir um parêntese: estive na Venezuela em 2007 e me impressionou como tudo no país recebe – agora com Chávez – o epíteto bolivariano: rua bolivariana, avenida bolivariana, universidade bolivariana, político bolivariano e assim sucessivamente ad nauseam, ad aeternum e ad infernum. Seria o pesadelo extremo daquela personagem do desenho animado Pernalonga (um baixinho, com longos bigodes cujo nome se esvaiu de minha memória). Em um episódio, o coelho Pernalonga deixa essa personagem de baixa estatura enlouquecida e paranóica. E, na sua mente enferma, todas as pessoas que vê na rua – policiais, mulheres, bebês... – são coelhos e sempre lhe contestam com a indefectível pergunta: “O quê é que há, chefe?” Foi mais ou menos isso que senti na República Bolivariana: “O quê é que há, bolivariano?” Demente.

Na panfletária película, os oposicionistas venezuelanos são pegos em seus piores momentos: numa associação patronal de bairro, um dos oradores pede que seus colegas vigiem suas empregadas domésticas, pois elas podem levar explosivos para detonar as casas burguesas; em outra cena, vemos imagens de algum canal privado do país e num desses programas matutinos de futilidades, quero dizer, variedades, a apresentadora se despede dizendo “Até quinta, de preferência sem Chávez!”; em um noticiário televisivo, em que o âncora anuncia que líderes da Acción Democrática solicitaram um exame de sanidade mental do presidente. Por outro lado, dos chavistas só são apresentados os momentos de música e poesia, e não se fotografa a realidade dos militantes rojos, rojitos1 (assim os chama Chávez): desocupados, violentos, cegos ao personalismo do caudilho etc.

Em fevereiro de 2002, o presidente do país resolve acomodar sua “cumpanheirada” na cobiçada estatal Pdvsa, em detrimento aos quadros técnicos que geriam a empresa até então. Foi a senha para a oposição convocar uma marcha em direção à sede da petrolífera. Neste ponto, A revolução não será televisionada assume o papel de imprensa chavista e manipula/distorce as informações a gosto. Os oposicionistas liderados pelo presidente da federação de comércio local (um equivalente seria a Fiesp no Brasil), Pedro Carmona, e o líder da principal central sindical do país, Carlos Ortega, decidem entre si desviar a passeata da sede da Pdvsa até o Palácio de Miraflores (palácio do governo) onde chavistas já estavam acomodados. Só poderia dar em morte – e deu. Ambos, situação e oposição, se acusam pelo assassinato de pelo menos 19 pessoas no dia 11 de abril de 2002. Para Bartley e O’ Briain, por supuesto, as mortes foram causadas pelos militantes oposicionistas. Os irlandeses conseguiram filmar dentro de Miraflores os bastidores do golpe, a prisão de Chávez, a assunção de Pedro Carmona como presidente venezuelano e o contragolpe a partir de membros da guarda leal ao recém-deposto presidente.

A revolução não será televisionada termina com Hugo Chávez reassumindo o posto de mandatário máximo do país caribenho. Nos anos que se seguiram ao golpe perpetrado pela dupla Carmona/Ortega, o governo Chávez transitou de uma semi-democracia pautada no mais castiço populismo latino-americano para um regime totalitário e ditatorial, pura e simplesmente.

O golpe de 02 é sempre utilizado pelo caudilho para justificar qualquer ação institucional de seu governo no âmbito de cercear a liberdade de imprensa – daí o fechamento da mais famosa rede de televisão local, a RCTV, em 2007, de 250 rádios com programação ligada aos poucos – e bravos – oposicionistas, em 2009, ademais das ameaças constantes ao canal Globovisión. Tal qual Il duce, o ditador italiano Benito Mussolini, Chávez fomentou grupos para-militares que devem obediência apenas ao ditador venezuelano (La Piedrita e Los Tupamaros – nome que imita o dos guerrilheiros/terroristas uruguaios dos anos 70, são exemplos), além das constantes agressões às instituições universitárias – as não-bolivarianas, que fique claro. Mas o mais aterrador é, sem dúvida, a Lista Tascón, de 2004. A dita lista enumera as pessoas que votaram a favor de um referendum revocatório do governo Chávez naquele ano. Aos desavisados que tiveram sua firma na lista, restou prosseguir a vida sem contar com a proteção e qualquer benefício do Estado: não podem mais tirar passaportes, os que eram funcionários públicos – de qualquer nível – foram exonerados, é negado crédito oficial aos empreendedores da Lista Tascón, entre outras arbitrariedades que tais.

A Venezuela caminha a passos céleres para uma guerra civil. As fraturas da sociedade local não estão mais calcadas nas diferenças entre pobres x ricos, mas entre chavistas e anti-chavistas. O país caribenho ficará rojo, rojito com o sangue dos embates que se aproximam. Por hora, já está vermelho de ódio.



1 Vermelho, vermelhinho é a referência de Hugo Chávez a seus militantes e seguidores, pois costumam usar camisa vermelha, símbolo da esquerda.


*Pedro Sobral é licenciado em história pela Universidade Católica de Pernambuco, bacharelando em ciências sociais pela UFPE, professor da rede pública e particular e cinéfilo nas horas vagas.

16 comentários:

Miradouro Cinematográfico disse...

Em véspera de eleição (no Brasil), nada melhor que do que pensar política (infelizmente, boa parte das pessoas só o faz em período de campanha eleitoral, e pior, não sabe diferenciar o termo política em sentido amplo, de sua utilização restrita ao âmbito - grosso modo, degradado - da política partidária). Assim, resolvi postar o texto de meu colega da graduação de História Pedro Sobral (até agora meu ÚNICO colaborador neste blog) sobre o documentário "A revolução não será televisionada", que se debruça sobre a tentativa de retirarem o presidente venezuelano Hugo Chavez do poder em 2001 (já vai fazer 10 anos, o tempo passa rápido - Lulinha já está ai a 8 anos e pelo visto passará mais 8, após se "afastar" nos 4 que serão administrados pela "companheira" Dilma).
Pois bem, acredito que a presente resenha dará ensejo muito mais a uma discussão política mais ampla do que a um debate que se centre especificamente no filme. A seguir, postarei minhas considerações.
Mais uma vez, agradeço a Pedro pela colaboração, informando a todos que tenho outros textos dele, os quais pretendo postar mais para a frente.

Pedro S. disse...

Alberto,

Obrigado por ceder espaço às colaborações no Miradouro.

Quanto aos seus comentários, não vejo a eleição de (Estela)Dilma Rousseff como algo inexorável. Só o fato de não ter levado no 1°turno já foi uma grande vitória da democracia. Explico-me: na teoria da ciência política às minorias estão salvaguardadas direitos fundamentais (é mais ou menos por essa razão que não se aceita que os turcos dizimem os curdos em seu território; os romenos aos ciganos etc.). Quando o Secretário de Imprensa do Governo Lulla, Ricardo Kotcho, disse em junho deste ano que queria descobrir quem são os 4% de brasileiros que classificam o Governo Lulla de ruim ou péssimo a luz vermelha alumiou no horizonte. Querem a unanimidade? A aprovação total? Isso é uma característica do fascismo - não pode haver oposição porque qualquer oposição é anti-nacionalista.

Muitos pontos de contato podem ser estabelecidos entre o governo semi-autoritário de Chávez e o governo do apedeuta e boquirroto Lulla. A diferença é que o Brasil tem uma classe média muito mais sofisticada que os vizinhos caribenhos.

No dia 31, apesar de ser Haloween nada de votar na bruxa,certo?

Miradouro Cinematográfico disse...

Então, postei este comentário antes do resultado da eleição e não tive tempo de tecer as considerações posteriores que prometi, pois viajei - e continuo fora -, mas achei que Dilma venceria.
Se ela irá ganhar ou ñ, nem imagino, acredito que esteja em aberto, mas de fato a ida p/ segundo turno foi um grande revés p/ Dilma. Serra estava mais feliz que mosquito em pão doce. O PT, ou ao menos certas tendências,são mesmo autoritárias, mas a idéia de que Dilma seria menos pior do que Serra não é exclusiva de nordestinos (e quiçá nortistas), pois estive num congresso de filosofia e numa conversa com um professor do interior de MG, este manifestou esta mesma perspectiva (é interessante mencionar que ele sabia quem era Marco Maciel, Arraes e outros, se não me engano, exceto João Paulo).

Outro fato é que Dilma é um verdadeiro fenônemo, conseguindo um fato que poucos poderiam alcançar: tornar Serra um sujeito carismático.
Enfim, seja com a bruxa (acato seu adjetivo), seja com o careca, estaremos mal, muito mal.

O filme e a questão Chaves comentarei posteriormente, quando retornar de viagem.

Pedro S. disse...

Olha Alberto, boa parte das Minas Gerais tem uma composição climática e geológica parecida com a do nosso Sertão, sobretudo no norte do estado, tanto é que a Sudene atendia aos pleitos dos mineiros, também. As demandas e os preconceitos são parecidos. Imagino que parte substancial dos mineiros sejam assistidos com esses programas como o bolsa-esmola. No Brasil são 13 milhões de famílias – creio que a terça parte da população do país ou quase isso: uma multidão de vadios que nada fazem e que podem ganhar de 250 a 510 reais por mês, todos os anos, basta ter uma criança dos 6 aos 15 anos matriculada em uma escola pública e comprovar que não tem renda para mantê-la ou mantê-los, pois o limite do benefício é de até três crianças. Não que meu candidato José Serra não tenha prometido que se eleito dará até o 13° salário de bolsa-esmola, pois prometeu isso. Só que ele poderia mudar as regras da esmola (quem seria louco de extinguir esse programa de esmola e perder de uma só vez uns 30 milhões de votos?!?!), diminuindo de 9 para três anos o benefício, obrigando os responsáveis pelos estudantes a também eles se profissionalizarem etc. Qual o exemplo de país onde o Estado de Bem-Estar Social é mais presente? Vamos dizer que seja a Alemanha. Lá, se eu perder meu emprego hoje terei dois anos de seguro-desemprego e o aluguel de minha moradia pagos pelo União. São no máximo 2 anos. E aqui no país com esse programa canalha?

Pedro S. disse...

Nem Serra nem Dilma têm aquela característica que Max Weber chamará de liderança carismática. O Lulla, o Chávez, o Perón, o Mussolini, o Hitler, sim a possuem (isso mesmo, coloquei Lulla ladeado por personagens caudilhescos e autoritários). Mas o país necessita de uma dominação legal, amparada nas leis e não na vontade do super-presidente que estiver no Planalto no momento.
Quero que você leia esses escritos de Reinaldo Azevedo (http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/?gclid=CJLTsIyXgqQCF59m7AodFkUxHQ)

Miradouro Cinematográfico disse...

Tbm sou contra este assistencialismo DESMEDIDO e a título ñ de paliativo, mas de solução. Quanto a Minas, sei de tais similitudes climáticas, mas ñ acho que a metalidade seja tão próxima a do NE; acredito que seja um meio termo entre SUdeste e NE; curiosamente, mencionei isso antes da capa da Veja que colocou Aécio Neves como possível trunfo tucano; nada mais forçado. Acredito que agora (posto esta resposta somente hoje, 30/10/2010, véspera da eleição de Segundo Turno), nem o Sr. acredite na vitória do careca. Mas eu tinha certeza da vitória da bruxa desde o início. Se fomos p/ Segundo Turno, foi pelo fator Marina, ñ por méritos tucanos.
Não revelo meu voto - que aliás pode ser modificado em plena sessão eleitoral, como ocorreu com o p/ governador no último pleito - mas achei excelente o argumento de um amigo pró-Serra - e ele, p/ minha surpresa, afirmou que votaria no careca contra a vontade - : o fato de o PT ter maioria no Congresso. Reitero minha posição: com ele ou com ela, estaremos mal, muito mal; com o PT, sério risco de censura, de "Dirceuzada", de aproximações ao castrismo; com o PSDB, privatizações criminosas - nem todas são más - e quiçá os absurdos pedágios que vi em SP. E os ditadores do DEM de volta.

EM tempo: o fato de ter mencionado carisma ñ significa que ache tal caracteristica importante (muito menos essencial) num presidente; antes o contrário, pois desistimula o messianismo (mas estimularia, talvez, golpes...).

Miradouro Cinematográfico disse...

Agora, especificamente sobre "A revolução não será televisionada": achei teu texto muito bem argumentado (não há como não destacar o trecho onde te referes ao personagem do desenho Pernalonga - na internet, achei seu nome original - Yosemite Sam -, se bem que acho que te equivicaste quanto ao bordão do coelho: não seria "O que é que há, velhinho?"?); além do brilhantismo da analogia, merece destaque o caráter empírico da situação a qual ela alude, qual seja, sua constatação direta (ao vivo, a cores e a corpo) da situação venezuelana. Enfatizo este ponto, pois ñ se pode confiar na imprensa direitista (Veja, Globo), nem na esquerdista (Carta Capital, Caros amigos). Deste modo, vejo-me um tanto totalmente refém do "só acredito vendo".
No entanto, em que pese sua erudição e sua honestidade, conheço um prof. (de filosofia, já maduro e apesar disso, ñ um fossil comunista) que é esclarecido e altamente entusiasta de Chavez, já tendo tbm ido aquele país. COmo ñ fui, como posso me posicionar? Sem contar que, em que pese certas medidas autoritarias do lider bolivariano, ele foi eleito democraticamente, e ainda tem apoio da maioria. AI põe-se as seguintes questões: uma população pode sustentar democraticamente um regime autoritário (ñ seria uma contradição em termos?); seria Chavez um ditador, se possui apoio popular? (seria aqui o caso de pesquisar a origem e as modoficações do conceito, p/ saber se ditador equivale a autoritário, anti-democrático, ambos, enfim, coisa que ñ farei agora; aliás, isto daria um belo artigo!).
Me parece que tuas críticas conseguem de fato demolir o filme (o qual ainda ñ assisti), o mesmo ñ valendo em relação ao governo chavista, que se trata duma situação muito mais complexa do que aquela que a imprensa alienada (seja de direita, seja de esquerda)põe.
Novamente, o cheiro que me sobe às ventas ñ é o de maniqueísmo, mas duma oposição na qual nenhum dos lados aparenta ser realmente bom.

Pedro S. disse...

Caro Alberto,

Prefiro pagar pedágios e transitar por rodovias seguras a... Essa opinião pessoal e médio-burguesa se dá, em parte, pelo que vejo quando pego a BR 101-Sul em direção a Maceió, onde mora minha avó e onde comemoramos o natal com toda a família: a qualidade da via desde que fui dirigindo para lá pela primeira vez em 2002, é horrenda. Buracos, sinalização precária, falta de acostamento, falta de telefones para avisar de um eventual acidente, é triste.
Nos países pós-industrializados não se percebem estatais. O que existe é, no máximo, agências reguladoras, seguradoras e resseguradoras. Dói no bolso você pagar dobrado pela educação, saúde, segurança pública, transporte: na primeira vez, pagamos os impostos e na segunda pagamos porque os serviços públicos listados são de péssima qualidade: aí a média burguesia tem que comprar plano de saúde, escola privada, gradear a casa – ou comprar um rottweiller, ou pagar um vigia, guarda do apito, NE Segurança de Valores... –, também tem que comprar um carro para não viver espremido tal qual uma sardinha, fungando os odores do populacho nos Grandes Ônibus Lotados e por aí.
Bueno, sou muito simpático aos “ditadores do DEM”; na verdade, o antigo Partido da Frente Liberal agregou apoio a Tancredo Neves, no Colégio Eleitoral, e ajudou a derrotar o candidato ungido pelos militares, Paulo Salim Maluf, do então PDS. Quem disse que a “petralhada” não têm devaneios verdadeiramente autoritários?
O que me deixa mais aborrecido é o fato do Grande Mu(lla) – não tenho dúvida de que o PT é uma seita, onde se paga o dízimo, onde se consegue uma boquinha – ou bocarra, onde se trabalha não trabalhando (aspones) etc. ter esses índices estratosféricos de popularidade. Serão mesmo verdadeiros? E se o forem, onde anda a dignidade dessa gente brasileira? São tantos escândalos e tão recorrentes e tudo passa batido pelo povo que só quer saber de ser sustentado pelo Estado em detrimento do empreendedorismo, este o grande gerador de riqueza.

Pedro S. disse...

Sobre o documentário a "Revolução não será televisionada": procurei muito no Google o nome da personagem enlouquecida com as diabruras de Pernalonga, e não sabia que tinha esse nome. Era melhor que fosse o Gaguinho, com aquela história dele de “Eu vou pe-pe-pe-gar aquele tuelho da-da-da-na-do!

Não acho que tenha te dito que fui entrevistado lá na Venezuela pela Venezolana de Televisión, mais conhecida como VTV, emissora oficial. Em agosto de 2007, o país se encontrava às vésperas de um referendo para decidir sobre uma mudança na Constituição Bolivariana tendo, entre outros itens, o apelo à reeleição indefinida para presidente. Quando o entrevistador me perguntou o que achava disso, da reeleição indefinida, disse que era brasileiro, mas que estava inteirado do assunto. Senti medo e perguntei ao trio (entrevistador, iluminador e câmera): ¡Y se yo hablara lo que pienso como sabré que no me va a pasar nada! O governo do tiranete beiçola não está para brincadeira. O cretino já alertou: quer ficar no poder até 2024 (levando-se em conta que começou a governar a Venezuela em 1999...).

O pior, Alberto, é que o beiçola não tem o apoio da maioria. Não mais. Ele perdeu o referendo supracitado de novembro de 2007. Em princípio, respeitou o resultado das urnas, mas em janeiro de 2008 convocou o mesmo referendo e desta feita ganhou com margem pequena (o voto por lá não é obrigatório); no 27 de setembro último, perdeu as eleições para a Assembléia Nacional: 52% do escrutínio foi endereçado aos candidatos da oposição, reunidos num grande conjunto de agremiaçãoes, o chamado MUD, Mesa de Unidad Democrática (curioso que /mud/ , em inglês, significa “lama”. Isso é apenas uma coincidência!)

Ainda quero comentar sobre o filme, mas deixarei para uma outra hora...

Miradouro Cinematográfico disse...

Concordo que seja melhor pagar – caro, além de duas vezes – pedágio do que transitar em vias em péssimo estado de conservação, que põe as vidas dos condutores em sérios riscos (como se já não bastasse a recorrente irresponsabilidade de muitos motoristas deste país); no entanto, há ai duas questões: 1) o fato de a estradas administradas pelos governos serem ruins não é algo necessário; dito de outro modo: não há apenas a escolha entre privatização a preços extorsivos ou estradas “governamentais” caindo aos pedaços, de modo que resignar-se a este expediente me parece uma forma acrítica de resignação; 2) dever ser dado ao cidadão a liberdade de optar ou não pela forma privada; estais corretíssimo ao dizer que temos de pagar duas vezes por educação, segurança e saúde de qualidade, já que as que o Estado nos oferece é insatisfatória, daí temos (quando nossa finança nos permite), de recorrer a instituições privadas. No caso das rodovias (pelo menos pelo que ouvi professores falarem no congresso em que fui recentemente, no interior de São Paulo), não há outra opção: ou se vai pelas privatizadas, ou não se vai.
Não concordo com as apas que puseste no termo ditadores do DEM. O fato de terem aderido a Tancredo e de hoje serem (posarem?) de democratas (sic) não lhes exime da responsabilidade pelos CRIMES cometidos. Concorde-se ou não com os planos de Jango, ele foi eleito, coisa que os militares não foram. Sem contar que os menos ortodoxos pretendia entregar o poder aos civis em pouco tempo, mas a linha dura levou-nos a 20 anos de atraso. Entendo sua indignação diante do disparate petista e sobretudo diante da conivência do vulgo e da imprensa com ela (e não foi sempre assim?), mas me preocupo com a ortodoxia crescente de suas posições; a continuar assim, em breves serás um saudosista da ditadura militar. Esse apoio a Tancredo e não a Maluf mas soa mais como bom senso do que como boa índole, se é que me entendes. Tino político.
Eu tenho uma visão deveras negativa do PT, mas separo joio do trigo: a cúpula é corrompida até o talo, mas acredito que ainda há gente honesta ali (mas de uma ingenuidade estupida).
Olha, em que pese minha enfática a crescente desconfiança na imprensa, acredito que os índices sejam verdadeiros sim. Fico estarrecido com tua pergunta, pois me parece ser a de alguem que não só não vive no Brasil, mas que pouco sabe dele; penso que o vulgo nacional seja sem vergonha, conivente com a corrupção justamente por raciocinar da seguinte forma: “se fosse eu, faria o mesmo”. É o famoso “jeitinho brasileiro”, ethos máximo da nossa cultura. Sérgio Buarque estava certo, mas não foi suficientemente veemente. Collor só caiu pq a Globo quis (botaram-no e tiraram-no do poder). Não foi um movimento espontaneamente popular. Lula fez algo tão grave quanto (ou quase) na minha opinião, mas sua melhor relação com a imprensa (inclusive com a Globo, que para mim NÃO foi contra o PT nesta eleição) o garantiram no poder sem maiores preocupações. Cabe lembrar que o já citado Maluf foi eleito várias vezes sob a alcunha de “rouba mas faz”. Preciso dizer mais?

Miradouro Cinematográfico disse...

Encontrei o nome do personagem na internet, mas acredito que seja o nome original, não o usado aqui no Brasil (confesso que não lembro do desenho, ou melhor, dos personagens sim, ainda que nem todos, mas dos episódios não).
É, não me disseste isso. De qualquer forma, se ele não está mais com a maioria, a queda é só questão de tempo, pois na conjuntura internacional, existe muita mais gente contra que pró Chaves. Como disse, não tenho posição definida pois não confio em nenhuma das fontes de informação que possuo a respeito do assunto. Vou postar aqui o título do livro do qual lhe falei, e deixarei maiores detalhes p/ tratarmos por mail; trata-se do recém lançado “Crise do estado liberal na América Latina”, organizado pelo prof. Do Dpto. De filosofia da UFPE Luiz Vicente Vieira, e contando com a participação de alunos de graduação e pós graduação dos cursos de filosofia, história, ciência política e ciências sociais, integrando o NEDAL (Núcleo de estudos e debates sobre a América Latina); meu interesse em divulgar a obra não é concordar nem discordar, mas estimular o debate.
O debate (polarizado em nós dois) acerca da postagem rendeu bastante, mas de fato não discutimos o filme propriamente (o qual continuo sem haver assistido).

Pedro S. disse...

Bom, o Estado brasileiro bem que poderia privatizar suas rodovias. Acredito que seria interessante a criação de mecanismos para inibir o uso do automóvel privado, inclusive dentro das cidades. Se o sujeito vai para o centro expandido do Recife, por exemplo, teria que pagar pedágio na Cruz Cabugá, no Cais José Estelita e na Av. Conde da Boa Vista – isso é assim nas grandes cidades européias e nos EUA. A união entre má qualidade do serviço público e a isenção de taxa só existe nas repúblicas bananeiras da América Latina, na África e nos atrasados da Ásia e Europa. O mundo pós-industrial paga para andar no auto privado: combustível, impostos como o IPVA, e pedágios, muitos e caros pedágios. [Só em saber do estímulo que o Grande Mu(lla) deu para a compra do carro particular em detrimento do transporte público, me causa arrepios. É o Brasil, como sempre, correndo com a marcha à ré engatada; e a patética proposta do Trem Bala Rio-SP, para a Copa do Mundo? Só nos primeiros esboços do custo da obra já se chegou à conclusão que daria para construir/expandir 10 metrôs nas principais capitais do Brasil. E a canalha petista – isso é uma redundância – vir falar (falar, essa gente não fala, relincha, mesmo) que olhou para o NE com carinho que trouxe investimentos para cá: onde estão?!?]
Contra preços abusivos, no que toca à cobrança de pedágios, deveria existir uma atuação mais eficaz das Agências Reguladoras – em se tratando, claro, de serviços que não foram privatizados pelo Estado, mas pela iniciativa de companhias particulares.
Mantenho minhas aspas nos “ditadores” do DEM. Nenhum dos atuais (a exceção de Marco Maciel) quadros do DEM tomou parte na Ditabranda Militar do Brasil. O DEM, hoje, pode ser caracterizado como um partido que defende a diminuição do Estado, o liberalismo na economia, as liberdades individuais e de expressão. Hoje, os ditadores estão acoitados no Partido da Trapaça, o PT, vide o documento PNDH-3 e seu feroz combate ao que a petralhada chama de mídia – a parte da imprensa, hoje minoria, que não comunga dos mesmos valores dos barbudinhos ladrões...
Acho que você mistura um pouco alhos com bugalhos quando fala no sifilítico Jango e no DEM dentro de um mesmo período. Vá lá que a UDN seja o partido da época que emprestou alguns cromossomos à ARENA, que os passou ao PDS/PFL, que o fez ao DEM, mas queres alguém mais governista do que o pemedebista José Sarney? Não? Até porque nem tem - e ele tem o den da ARENA.
O DEM faz uma Oposição com letra maiúscula aos petralhas, pois os tucanos e os pós-socialistas ainda dialogam, em alguns momentos até elogiam integrantes da petralhada. Eles são autênticos na posição de oposicionistas.

Pedro S. disse...

Onde houver DEN, leia DNA, caro amigo Alberto!

Pedro S. disse...

Às vezes também me surpreendo com a minha mudança de postura política. No limite, não posso sentir saudades da Ditabranda brasileira, pois não a vivi de fato, já que nasci em 1979. Em matéria de segurança pública, por exemplo, podia-se ficar até tarde da noite na rua que o perigo era residual. A vida deveria ser dura apenas para esquerdistas. Havia até “Esquadrões da Morte” criados à revelia da PM que entravam nas favelas matando assaltantes, estupradores e esquerdistas – e para mim bandido bom é bandido trucidado, de preferência sem julgamento, para que não cumpra só 1/3 da pena em regime semi-aberto.
Agora bem que seria necessário desmistificar essa idéia de que tudo de ruim que existe hoje é oriundo dos anos de chumbo “leve” no país. A esquerda vive dizendo, inclusive, que a escola pública pré-64 era universal e de qualidade. Mentira, mentira e mentira. É mais ou menos como é hoje em relação às escolas de referência do estado de Pernambuco. Quantidade insuficiente (de escolas de qualidade) para uma demanda cada dia maior. Não havia – nem há – quantidade com qualidade; você sabia que o SUS data da Constituição de 1988? Antes, para o sujeito ser atendido num posto público precisava ter pelo menos carteira de trabalho assinada, se não tivesse... Diz-me aí, Alberto, se você já ouviu dizer que Humberto Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel, Figueiredo ou algum general da trinca apelidada de “Os Três Patetas” surrupiou ou desviou um centavo de cruzeiro para o próprio bolso ou para algum parente? Não à toa as Forças Armadas gozam de muito prestígio junto à sociedade brasileira que é, assim como eu, majoritariamente conservadora. Agora vamos falar dos presidentes civis de 85 para cá? Não tem um que não tenha roubado ou deixado roubar – e o governo Mulla fez os dois com maestria ímpar: verdadeiro Ali-babá e seus 400 ladrões!!!
Diga, por favor, quem o petralha honesto – oxímoro – que você conhece.
Max Weber já dizia que a razão da existência de um partido político é a chegada e manutenção no poder. Só que você deve governar com um projeto de poder e de governo simultaneamente. O PT só tem o primeiro. Falta clareza nas idéias quanto a rumos, programas de longo prazo, inserção do populacho no mercado de trabalho – e isso não pode ser sinônimo de vender CD pirata na Sete de Setembro – reformas institucionais etc. o PSDB quando deu ao país uma moeda forte, quando derrotou a inflação ou quando aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal promoveu um verdadeiro projeto de governo, fortaleceu nossas instituições, livrou-se de uma banda podre do Estado personificada em estatais ultra-ineficientes, que funcionavam apenas para a distribuição de carguinhos etc.

Pedro S. disse...

Sim, Alberto, conseguirei uma cópia de "A Revolução não será televisionada" para mim e depois gravo uma pra você. As três primeiras vezes que vi o filme foi na TV Câmara; uma vez foi no cinema Apolo; outra no CFCH; outra na Católica e que depois contaria com os comentários do analfabeto Luis Manoel - e eu não fiquei para ouvir os relinchos; outra com uma cópia emprestada por um colega de trabalho de minha namorada. Logo mais, tentarei comentar sobre o filme em si (finalmente)!

Miradouro Cinematográfico disse...

Vou levar ainda algum tempo p/ responder seus comentários acima. Pelo visto, contrastando com o baixo número - ou mesmo inexistência - de comentários nas demais postagens, nesta eles parece que nunca irão findar! Sendo que sempre na dicotomia vc e eu e muito mais focando uma discussão política do que estética, saindo assim - algumas vezes muito - do conteúdo do filme. Fique claro: isso não constitui uma crítica, apenas uma constatação!

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Alguém que escreve para viver, mas não vive para escrever; apaixonado pelas artes; misantropo humanista; intenso, efêmero e inconstante; sou aquele que pensa e que sente, que questiona e duvida, que escapa a si mesmo e aos outros. Sou o devir =)
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