segunda-feira, 11 de junho de 2012

PostHeaderIcon Cine PE 2012, terça-feira: uma noite introspectiva



                                                                                    "Dia estrelado"
                                                          

                                                                                       "A fábrica"


                                                                            "Sonhando passarinhos"


                                                                      "Na quadrada das águas perdidas"



                                                                                   "Estradeiros"



Ao contrário do que ocorrera no sábado, a noite de terça (feriado) do Cine PE 2012 teve um público notoriamente escasso. Não só por isso, mas também pela ausência de filmes “chamativos” – digamos assim –, como “À beira do caminho” e o documentário de Pedro Bial e Heitor D’ Alincourt sobre Jorge Mautner, o clima da noite pareceu-me estranhamente intimista, haja vista a recorrente alcunha segundo a qual o Cine PE constitui “o Maracanã dos festivais nacionais de cinema”.

Reforçando (para mim) o caráter intimista da noite, descobri que a jovem diretora do primeiro curta-metragem exibido é alguém com quem já cursei uma disciplina na UNICAP, embora eu fosse um estranho na turma (acho que era de jornalismo) e tenha passado quase completamente despercebido naquele espaço (sem contar que, pela primeira vez em anos de Cine PE, acomodei-me na parte superior do Cine-teatro Guararapes; o que quebrou um pouco o intimismo foi o fato de eu estar acompanhado, algo que não ocorria fazia anos no evento em questão).

Adentrando no primeiro curta exibido “Dia estrelado” (17 min., de Nara Normande), não há muito o que ser dito; trata-se duma animação stop motion de alta qualidade (na forma), mas pouco significativa no conteúdo (e saliento que minha comparsa naquela noite teve exatamente a mesma opinião que eu). Acaba de me ocorrer um insight no que concerne a expressar o que tal filme despertou em mim: trata-se duma fratura estética, haja vista que a qualidade da forma não se resume ao fato de a animação ser bem feita, mas também ao fato de ser ela expressiva (sempre observo se personagens de animação são realmente expressivos), de a trilha sonora ter sido muito bem encaixada, de o filme ter conseguido criar todo um clima, mas de a tudo isso ter faltado substância. Se em minha resenha sobre o curta “Km 58” (exibido no sábado – ver minha resenha em http://www.miradourocinematografico.blogspot.com.br/2012/05/noite-de-sabado-do-cine-pe-2012.html), afirmei que uma nova edição/montagem da obra poderia melhor aproveitar sua excelência técnica, no que concerne a “Dia estrelado”, penso algo parecido; se a parte técnica tivesse sido direcionada para um outro enredo, o filme poderia ser excelente; porém, da forma que foi realizado ele deixa a sensação de que poderia ter sido muito melhor, embora não chegue a ser ruim.

O segundo curta-metragem exibido foi “A fábrica” (15 min., de Aly Muritiba); trata-se duma caracterização realista da vida num presídio, que não intenta retratar o cotidiano deste, mas apenas uma situação específica nele ocorrida: trata-se da tentativa que a mãe do protagonista faz de entrar no presídio com um celular, para entregar a ele; poucas palavras são proferidas entre mãe e filho no seu encontro e o desfecho surpreendente do filme me fez gostar dele muito mais do que eu pensei que gostaria, ao começar a assisti-lo; sua mistura de hostilidade com afeição foi realizada com maestria.

Terceiro e último curta da noite, “Sonhando passarinhos” (12 min., de Bruna Carolli) mostra a história de uma pequena garota que deseja criar passarinhos; o enredo é simples, o filme é bonitinho (sem conotação pejorativa), as atuações são fracas (mas a guria é espontânea) e, acima de tudo, seu conteúdo é bastante pessoal, embora tal característica (paradoxalmente) desperte empatia de algumas pessoas (o que não foi o meu caso). Valho-me aqui da imprescindível contribuição de Txiliá Credidio, minha comparsa naquela noite, para elucidar o sentido de tal afirmação; segundo ela, os mínimos detalhes do filme remetem ao que foi a infância de uma garota na década de 1990 (experiência com a qual não tive o menor contato, pois não tenho irmã).

Antes de passar aos longas, aproveito para informar que dois dos três curtas tiveram problemas técnicos e precisaram ter sua exibição interrompida para ser(em) posteriormente reiniciada(s). Sobre isto, não poderia deixar de postar aqui a frase paradigmática de minha comparsa Txiliá: “Festival de cinema sem problemas técnicos não é festival de cinema”. Inspirado por ela, formulo a seguinte assertiva: “Cine PE sem atraso não é Cine PE” (quem freqüenta bem sabe...).

O primeiro longa da noite foi “Na quadrada das águas perdidas” (74 min., de Wagner Miranda e Marcos Carvalho). No elenco, apenas Matheus Nachtergaele; seu enredo é bastante simples: mostra o (longo) deslocamento de um sertanejo até uma venda para trocar dois cabritos por alimentos diversos. Como os realizadores deixaram claro ao apresentar o filme, sua intenção era didática, no sentido de familiarizar os espectadores com a paisagem da caatinga e, de fato, ele é surpreendente neste aspecto; vários animais aparecem na obra (cobra, pica-pau, coruja, outras aves; tamanduá, jabutis e mesmo um felino de grande porte – do tamanho de uma onça –, mas que não era nem pintado nem preto, de modo que não sei se era onça); aparece ainda uma colméia, bem como o procedimento do personagem para espantar parte das abelhas e consumir o mel; três espécies de cactos são mostrados, dois deles sendo consumidos. Mesmo no final do filme, quando o protagonista chega na venda, não vemos mais que o braço de seu interlocutor e não há uma única palavra proferida: os produtos desejados são apontados com a mão, limitando-se a isso a comunicação entre os dois homens. Aliás, a única palavra pronunciada no filme é o nome da cadelinha que acompanha o sertanejo; quando nota sua demorada ausência, ele assovia por ela e não obtendo resposta, a chama pelo nome algumas vezes. Isto acentua (e muito) e sensação de isolamento, o que pode tornar o filme um pouco maçante para algumas pessoas. Penso que isto seja proposital e verossímil, haja vista o caráter tour de force da jornada do personagem (muitas são as dificuldades por ele enfrentadas no caminho, inclusive cansaço e tédio). Por fim, cabe salientar que o filme retrata inclusive as crenças locais, como quando mostra o protagonista “assombrado”, juntar algumas pedras e formar um terço para rezar. Em suma, embora o filme não seja exatamente divertido, seu mérito não reside apenas em seu caráter informativo, pois além de informativo ele é interessante, ou seja, ele envolve, funciona.

Fechando a noite, exibiu-se o longa “Estradeiros” (79 min., de Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira). Trata-se dum documentário sobre um grupo de jovens itinerantes que residem em diversos locais da América do Sul e que possuem certos traços da cultura hippie em sua organização social. Um dos aspectos mais interessantes do filme consiste em mostrar como o grupo coleta alimentos (em boas condições para consumo) jogados no lixo por supermercados e com isso evitam no só o desperdício, como economizam seu pouco dinheiro (conseguido, por exemplo, através de malabarismos feitos em semáforos). Não há rumo no filme, tal qual a trajetória de um de seus entrevistados: aleatória, como o próprio afirma. Trata-se dum filme interessante, que nos faz pensar e (ao menos para mim), causa certa inveja, embora eu não deseje ter uma vida tão errante quanto a daquelas pessoas.

Em suma, minha opinião de que sempre é possível encontrar coisas boas no Cine PE, mesmo escolhendo aleatoriamente as noites nas quais iremos ao festival permanece.



Dedico este texto a Txiliá Credidio, uma comparsa inspiradora



Alberto Bezerra de Abreu, maio/junho 2012













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Alguém que escreve para viver, mas não vive para escrever; apaixonado pelas artes; misantropo humanista; intenso, efêmero e inconstante; sou aquele que pensa e que sente, que questiona e duvida, que escapa a si mesmo e aos outros. Sou o devir =)
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